Longe de querer ser original (aliás, o que é original, caro
Platão?), mas por ser extremamente útil, deparei-me com uma longa
rua, limpa e reluzente em suas vitrines polidas de dourado.
Temperatura amena e gente tranquila caminhando. Cada qual com o seu
tempo, com seu mundo. Tantos mundos juntos, algumas vezes se
esbarrando, mas tão separados e distantes.
Havendo chamado a minha atenção essa disparidade toda, notei, sei
lá se por acaso ou envergonhado, o maltrapilho que numa beirada de
um portal bem esculpido em pedra deixava-se estar.
Mendigava? Talvez! Mas o que? Não era o aspecto que afastava os
transeuntes, pensava eu. Era, na verdade, o peso das próprias
circunstâncias que os fazia cegos. Aquele homem acocorado era
invisível!
Deixando que meus “alfarrábios” mentais me lembrassem a lição
secular de que todos estamos ancorados no mesmo esteio da criação e
que sem prestarmos atenção podemos estar sendo testados na
observância desse ensinamento, retirei do bolso a pouca nota – que
provavelmente valor que compraria uma madura manga – coloquei-a naquelas mãos
endurecidas pelos tempo e segui o meu rumo.
Ainda insatisfeito pela perplexidade do alijamento a que todos
submetemos a cada um, voltei meu corpo em 180 graus para olhá-lo
mais uma vez e vi que ali ele não estava e haviam brotado em seu
lugar as alvíssimas mil pétalas brancas que são o privilégio de
assento de poucos escolhidos e merecedores no mundo.