terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Estátuas na areia


Em meio à paisagem um tanto quanto árida, destacavam-se duas belas estátuas do mais raro mármore. O esmero das formas mostrava os detalhes dos contornos e era possível crer na realidade da representação. Estavam uma defronte a outra a se olharem.
Os que por elas passavam admiravam o trabalho do escultor, bem como prestavam atenção nos motivos que as colocaram ali.
Na rapidez das mudanças inesperadas, sobe o pó das areias nas asas da ventania que transforma a paisagem em um único tom bege sem nenhuma outra forma ou cor. Ninguém consegue ver nada mais!
Cada uma das minúsculas pedras acabou tornando-se cruel esmeril a bater fortemente em ambas as estátuas. Uma permaneceu, em grande parte, em sua forma original, somente cravejada dos pequenos estilhaços, mas era possível reconhecê-la como antes. A outra, à medida em que era atingida, soltava fragmentos de sua película mais superficial e revelava, aos poucos, outra base interior. No final, descascada, era completamente outra imagem.
Baixada a agitação da poeira, a cena ressurgia. De um lado, a primeira escultura que, apesar de um tanto quanto mais porosa (devido ao polimento forçado), mantivera os mesmos contornos e feições. A segunda, já não mais na posição que fora colocada inicialmente, encontrava-se de costas a observar uma outra imagem em pedra que surgira após haver cessado o caos.
Entretanto, eis que surge, voraz e inclemente, no horizonte, outra névoa sólida que, na esteira do ar, torna a cobrir todo o cenário! Restava às estátuas esperar passar o torvelinho.
Arrefecidos os ânimos dos Senhores do Tempo, descortinava-se diferente palco. Aquela imagem que fora descascada anteriormente jazia solitária. Perto não estavam nem sua primeira companheira, muito menos a outra que surgira (sabe-se lá de onde). Não passou de miragem e como tal era magnífica, mas volátil. Tão impalpável como improvável.
Rescaldo de quem se deixara-se enganar pelos olhos do corpo e, advindo da tolice encantatória, findou os dias cega na alma!

4 comentários:

  1. Talvez ela não conseguisse, asssim como nós, enxergar com os olhos da alma, afinal eram estátuas, não? E sendo assim, o impalpável a elas pode parecer real. Ainda bem que somos humanos, criação do Todo Poderoso Senhor do Universo e não uma simples invenção humana! Belo texto!

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  2. Meu nobre: segundo a crença hindu, tb nós estamos em um mundo de ilusão e o que enxergamos (até Platão disse isto) é miragem. O fato de sermos imagem e semelhança do criador não nos garante 100% de acertos pq nem sempre agimos como Ele. Nós é que nos afastamos do Paraíso e assumimos a nossa dualidade. Mas entendo a sua colocação. Obrigado pelo elogio ao texto. Chegará o dia em que todos os "véus da ilusão" serão descortinados e encontraremos repouso na Eternidade. Por enquanto, "vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar."

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  3. Ilusão é o que nos deixa viver ignorante (tranquílo), quando os veús caem, nos despedaçamos com eles e só depois nos reencontramo-nos...

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  4. Enquanto humano, me permito viajar e viver nesse mundo de ilusões, pago um preço caro porque quando tudo se dissolve, a dor e a frustação geralmente não valeu a venda que coloquei. Mais um belo presente Daniel.

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