Em meio à paisagem um tanto quanto árida, destacavam-se duas belas
estátuas do mais raro mármore. O esmero das formas mostrava os
detalhes dos contornos e era possível crer na realidade da
representação. Estavam uma defronte a outra a se olharem.
Os que por elas passavam admiravam o trabalho do escultor, bem como
prestavam atenção nos motivos que as colocaram ali.
Na rapidez das mudanças inesperadas, sobe o pó das areias nas asas
da ventania que transforma a paisagem em um único tom bege sem
nenhuma outra forma ou cor. Ninguém consegue ver nada mais!
Cada uma das minúsculas pedras acabou tornando-se cruel esmeril a
bater fortemente em ambas as estátuas. Uma permaneceu, em grande
parte, em sua forma original, somente cravejada dos pequenos
estilhaços, mas era possível reconhecê-la como antes. A outra, à
medida em que era atingida, soltava fragmentos de sua película mais
superficial e revelava, aos poucos, outra base interior. No final,
descascada, era completamente outra imagem.
Baixada a agitação da poeira, a cena ressurgia. De um lado, a
primeira escultura que, apesar de um tanto quanto mais porosa (devido
ao polimento forçado), mantivera os mesmos contornos e feições. A
segunda, já não mais na posição que fora colocada inicialmente,
encontrava-se de costas a observar uma outra imagem em pedra que surgira
após haver cessado o caos.
Entretanto, eis que surge, voraz e inclemente, no horizonte, outra névoa
sólida que, na esteira do ar, torna a cobrir todo o cenário!
Restava às estátuas esperar passar o torvelinho.
Arrefecidos os ânimos dos Senhores do Tempo, descortinava-se
diferente palco. Aquela imagem que fora descascada anteriormente
jazia solitária. Perto não estavam nem sua primeira companheira,
muito menos a outra que surgira (sabe-se lá de onde). Não passou de
miragem e como tal era magnífica, mas volátil. Tão impalpável
como improvável.
Rescaldo de quem se deixara-se enganar pelos olhos do corpo e,
advindo da tolice encantatória, findou os dias cega na alma!
Talvez ela não conseguisse, asssim como nós, enxergar com os olhos da alma, afinal eram estátuas, não? E sendo assim, o impalpável a elas pode parecer real. Ainda bem que somos humanos, criação do Todo Poderoso Senhor do Universo e não uma simples invenção humana! Belo texto!
ResponderExcluirMeu nobre: segundo a crença hindu, tb nós estamos em um mundo de ilusão e o que enxergamos (até Platão disse isto) é miragem. O fato de sermos imagem e semelhança do criador não nos garante 100% de acertos pq nem sempre agimos como Ele. Nós é que nos afastamos do Paraíso e assumimos a nossa dualidade. Mas entendo a sua colocação. Obrigado pelo elogio ao texto. Chegará o dia em que todos os "véus da ilusão" serão descortinados e encontraremos repouso na Eternidade. Por enquanto, "vivendo e aprendendo a jogar, nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar."
ResponderExcluirIlusão é o que nos deixa viver ignorante (tranquílo), quando os veús caem, nos despedaçamos com eles e só depois nos reencontramo-nos...
ResponderExcluirEnquanto humano, me permito viajar e viver nesse mundo de ilusões, pago um preço caro porque quando tudo se dissolve, a dor e a frustação geralmente não valeu a venda que coloquei. Mais um belo presente Daniel.
ResponderExcluir