terça-feira, 12 de julho de 2011

Construção

No vai e vem entre a linha d'água que desenha o chão num tom mais escuro e a luz que se reflete mais clara, na areia, via-se a sombra das pernas curtas e apressadas que iam rumo à parafernália de plásticos, cores e formas que circundavam o fosso. Abrindo as mãos, despejava a argamassa tão molhada que ao invés de cair, escorria. Na mesma pressa, o caminho de volta trazia a missão de que não poderia demorar buscando mais material para a construção. Muitas tentativas. Muitas delas frustradas, pois gastando o tempo da trajetória, o sol, cumprindo sua função, convertia tudo em bloco ressecado de terra fina.

Mas o menino era persistente. Continuava no empreendimento.


Com uma gigantesca dificuldade iam-se levantando paredes e pilastras, preparando torres e bastiões. Por vezes, a ameaça de um vento natural que passava, outras, o sopro gerado por afoitos e distraídos que giravam por ali, transformavam o minúsculo corpo em obstáculo e segurança.


Exaurido da função, quis dar melhores resultados ao trabalho e deixou que lâmpada das ideias se acendesse. Por que não utilizar um adjuntório para garantir que as intempéries não voltassem a ser um infortúnio?


Fuçando aqui e acolá, encontrou num terreno meio-baldio um velho saco pardo com o acinzentado pó mágico. Recolheu o que lhe cabia nas mãos e triunfante aproximou-se da sua obra. Polvilhou o que já erguido estava e se dirigiu uma vez mais à orla. Trazia agora a empolgação na corrida. Todos os problemas de manutenção do trabalho estavam garantidos. Espargiu o líquido por cima de tudo que estava coberto de cinzas e esperou. Ufa! Era descasar e observar com admiração a perpetuação da labuta.


Como sempre, o astro-rei não tardou a deferir sua radiação e calor, calcificando ainda mais o amontoado esturricado de areia. O criador, ao observar a sua criação, com o peito estufado de quem diz “venci”, nota alguns pequenos ajustes que deveriam ser feitos. Sentou-se defronte a ponte que abaixada unia o portão de entrada à estrada dos forasteiros e chorou. Percebeu que nem sempre o melhor caminho é perpetuar os castelos que se constroem, pois mais adiante, em percebendo a necessidade de novas adaptações, não resta outra coisa a fazer a não ser derrubar tudo (com mais esforço e força do que se fosse somente areia) e começar outra vez.


Algumas imortalizações são como lápides: servem para somente informar que ali jazem os sonhos.

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